a
b c d e f
 

Tributo a Saul Airoso da Silva

     
e   Um trabalho sério e dedicado e a busca incessante pelo conhecimento, transformaram o menino pobre num dos líderes classistas mais respeitados em Itajaí. Saul Airoso da Silva possuia méritos não apenas pelo longo período em que foi o principal dirigente do Sindicato dos Estivadores de Itajaí, mas por ter resistido à pressão em defesa da sua categoria nos momentos mais icônicos da história da instituição.

Nascido em Itajaí no dia 15 de setembro de 1951, filho de Tibúrcio José da Silva e Luíza Izabel de Jesus, Saul foi o décimo filho de uma numerosa prole de onze irmãos. Pouco antes de completar oito anos, Saul perdeu o pai e teve que começar a trabalhar muito cedo para ajudar a mãe, viúva e que tinha como renda apenas um salário mínimo da pensão do pai, para ajudar a sustentar a família.


O primeiro emprego, de meio período ainda quando cursava o ensino primário, foi na Fábrica de Pirulito “Bom, Bom de bico”, onde passava as tardes cortando madeira para fabricar os palitinhos do pirulito. O salário que recebia era suficiente apenas para comprar um quilo de carne por mês, mas o simples fato de estar contribuindo com a família já o enchia de orgulho.


Tentou ainda trabalhar como aprendiz de mecânico, mas foi na alfaitaria que Saul “apostou” suas fichas. Trabalhou em várias alfaitarias de Itajaí até que, em 1966, a convite de um irmão, foi morar em Curitiba-PR, onde empregou-se numa grande empresa como alfaite.


Itajaí, talvez, jamais viesse a conhecer todo o potencial de Saul se não fosse por insistência de sua mãe que, em 1975, o convenceu a voltar para sua cidade Natal. Em seu retorno, conheceu e casou-se com Cassia, em 1976, com quem teve três filhos, o primeiro do qual faleceu aos nove meses de idade.


Saul continuou trabalhando em diversos empregos, especialmente em malharias. Mas um outro talento logo chamou a atenção de seus amigos: o futebol. Hábil com a bola, Saul foi convidado a integrar um time de futebol que era destaque da Liga Itajaiense de Futebol, o Estiva, formado por trabalhadores do Sindicato dos Estivadores de Itajaí.


Dos gramados para os porões do navio foi um passo. Em meados dos anos 80, os estivadores, seus colegas de futebol, o inscreveram para trabalhar como reserva – substituindo em caso de ausência dos estivadores efetivos. Em 1º de julho de 1987, Saul foi inscrito como estivador registrado após uma determinação do Capitão dos Portos de Santa Catarina, já que a Diretoria, à época, não quis aceitar suas inscrição, privilegiando reservas mais novos. Trabalhando sempre como alfaiate, Saul estranhou bastante sua nova atividade, no início. Mas foi um colega de porão que mudou sua concepção pela estiva, lembrando que eles eram “empregados sem patrão” e, portanto, podiam trabalhar como e quando quisessem.


Essa nova realidade era uma novidade para Saul que decidiu aprofundar-se no assunto. Passou a estudar a legislação e aprendeu todas as normas sobre o trabalho portuário avulso. Passou a ser assíduo nas Assembleias do Sindicato. Em 1989, foi indicado para participar do Congresso Nacional dos Estivadores, em Vitória-ES, sendo mais novo estivador efetivo (em tempo de atividade) a participar de um evento desse porte. E, a partir de então, participou de todos os congressos nacionais e internacionais que lhe foi possível.


Em 19 de janeiro de 1990, durante uma Assembleia, a então diretoria do Sindicato dos Estivadores foi destituída de suas funções, e Saul foi indicado a participar, como Secretário, da Junta Governativa que assumiria a instituição por 90 dias, com a missão de organizar uma nova eleição. Sob  a presidência de Jair Laurentino das Neves, tendo Saul como secretário e Saul Chaves de Arruda como tesoureiro, a Junta formou uma chapa e foi eleita para o comando do Sindicato para o triênio 90/93.


Em 1993, Saul foi eleito pela primeira vez como presidente do Sindicato dos Estivadores, tendo como colegas de chapa Jadir José Couto, como secretário e Saul Chaves de Arruda como tesoureiro.  Foi um período tumultuado e, por conta de acusações de um grupo contrário, essa diretoria foi destituída em 29 de abril de 1995, sem completar o mandato.


Da mesma forma, a diretoria que sucedeu Saul não chegou a cumprir com seu mandato. Em nova Assembleia, Saul atendeu o apelo de seus colegas e assumiu novamente uma Junta Governativa para, 90 dias depois, ser aclamado em eleição como presidente, numa proporção de cinco votos contra um em favor da oposição, para o mandato 1997/2000, na chapa que contava também com Gilson Carlos dos Santos, como secretário, e Renato João Fernandes como tesoureiro. Essa formação também se reelegeu consecutivamente por mais três mandatos, de 2000 a 2003, 2003 a 2007 e 2007 a 2010, nessa última contando com Charles Alberto dos Passos como secretário e Paulo Antônio Cabral como tesoureiro.


Por conta de desacordos entre as categorias avulsas e a Portonave, que se instalava no município de Navegantes, Saul e seus pares perderam a eleição em 2010. Em 2009, ele assumiu o cargo de Diretor de Integração Portuária no Porto de Itajaí e, por conta do descontentamento da categoria, foi convidado a concorrer novamente à presidência dos Sindicato dos Estivadores, elegendo-se junto com Gilson Carlos dos Santos como secretário e Luiz Antônio Ferreira para a gestão 2013/2016.


Saul ainda reelegeu-se presidente para a gestão 2016/2019, tendo como parceiros Nivaldo Francisco Cardoso (secretário) e Gilson Carlos dos Santos (Tesoureiro). Formando nova chapa tendo Gilson como Secretário e Luiz Antônio Ferreira como tesoureiro, Saul reelegeu-se uma vez mais para a gestão 2019 a 2022, entregando a presidência do Sindicato dos Estivadores à chapa liderada pelo Ademar Tomaz dos Santos Filhos, que contou com o seu apoio.


Ao todo, foram mais de três décadas à frente do Sindicato dos Estivadores de Itajaí, e num dos períodos mais expressivos da história da atividade portuária no Brasil. Com a extinção da Portobras, em 1989, o Porto de Itajaí passou a ser comandado pela Codesp – Companhia Docas de São Paulo. Comentava-se, à época, que até para trocar um parafuso num equipamento era necessário obter autorização do Codesp, o que levava meses para acontecer. No início de 1995, a Codesp lançou um plano de demissões incentivado no Porto de Itajaí e mais da metade dos trabalhadores da administração portuária de então manifestou interesse em aderir ao plano. Com isso, o porto de Itajaí fecharia suas portas.


Foi o estopim para uma verdadeira “revolução” acontecesse na cidade. Lideranças políticas e empresariais uniram-se em defesa do porto e, por meio de uma manobra muito bem elaborada, o então prefeito Arnaldo Schmitt conseguiu convencer o então Ministro dos Transportes, Odacir Klein (antigo colega de Câmara dos Deputados), a conceder a Administração do Porto de Itajaí, a título precário, pelo período de dois anos. Em 1997, já sob a Administração Jandir Bellini, e tendo em vista o incremento da atividade portuária sob esse novo modelo de gestão, o Ministério dos Transportes ampliou a concessão do porto ao Município por 25 anos, prazo que se encerrou no de 2022 e foi prorrogado por mais dois anos.


Com inquestionável liderança junto aos trabalhadores portuários avulsos, Saul desempenhou um importante papel nesse processo de municipalização e incremento da atividade portuária na cidade, sendo responsável direto pela garantia dos direitos dos trabalhadores avulsos continuarem exercendo sua atividade, mesmo com a privatização da operação portuária.


Por ter priorizado o diálogo e defendido a bandeira dos trabalhadores portuários avulsos, em especial dos estivadores – categoria cuja história confunde-se com a história da própria cidade. Por esse motivo, Saul recebeu uma Moção Honrosa concedido pela Câmara de Vereadores de Itajaí durante uma Sessão Solene que comemorou os 100 anos do Sindicato dos Estivadores.


Apesar de afastado do Sindicato, Saul jamais esqueceu seus colegas, sendo presença constante na sede. Por isso seu falecimento precoce e inesperado, vítima de um enfarto fulminante, surpreendeu a todos. Saul morreu na manhã do dia 30 de abril, tendo sido seu corpo cremado no dia 1º de maio, curiosamente, no Dia do Trabalhador, categoria que sempre defendeu.

<== Voltar para o início Voltar para "Notícias" ==>